segunda-feira, 6 de abril de 2015

Canteiros - Raimundo Fagner, em poesia de Cecília Meireles


Composição de Raimundo Fagner, inspirada no poema "Marcha", de Cecília Meireles.
Gravado  no programa Ensaio (TV Cultura), exibido em 26/08/2005.



Canteiros
Quando penso em você fecho os olhos de saudade
Tenho tido muita coisa, menos a felicidade
Correm os meus dedos longos em versos tristes que invento
Nem aquilo a que me entrego já me traz contentamento
Pode ser até manhã, cedo claro feito dia
mas nada do que me dizem me faz sentir alegria
Eu só queria ter no mato um gosto de framboesa
Para correr entre os canteiros e esconder minha tristeza
Que eu ainda sou bem moço para tanta tristeza
E deixemos de coisa, cuidemos da vida,
Pois se não chega a morte ou coisa parecida
E nos arrasta moço, sem ter visto a vida.



Marcha - Cecília Meireles
As ordens da madrugada 
romperam por sobre os montes: 
nosso caminho se alarga 
sem campos verdes nem fontes. 
Apenas o sol redondo 
e alguma esmola de vento 
quebraram as formas do sono 
com a idéia do movimento. 

Vamos a passo e de longe; 
entre nós dois anda o mundo, 
com alguns vivos pela tona, 
com alguns mortos pelo fundo. 
As aves trazem mentiras 
de países sem sofrimento. 
Por mais que alargue as pupilas, 
mais minha dúvida aumento. 

Também não pretendo nada 
senão ir andando à toa, 
como um número que se arma 
e em seguida se esboroa, 
-- e cair no mesmo poço 
de inércia e de esquecimento, 
onde o fim do tempo soma 
pedras, águas, pensamento. 

Gosto da minha palavra 
pelo sabor que lhe deste: 
mesmo quando é linda, amarga 
como qualquer fruto agreste. 
Mesmo assim amarga, 
é tudo que tenho, 
entre o sol e o vento: 
meu vestido, minha musica, 
meu sonho, meu alimento. 

Quando penso no teu rosto, 
fecho os olhos de saudades; 
tenho visto muita coisa, 
menos a felicidade. 
Soltam-se os meus dedos tristes, 
dos sonhos claros que invento. 
Nem aquilo que imagino 
já me dá contentamento. 

Como tudo sempre acaba, 
oxalá seja bem cedo! 
A esperança que falava 
tem lábios brancos de medo. 
O horizonte corta a vida 
isento de tudo, isento... 
Não há lagrima nem grito: 
apenas consentimento.

---/---


Equipe 3AVMídia



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